Deus é transformado em ídolo...

A pior idolatria é aquela que resulta da equivocada compreensão do caráter de Deus, isto é, quando ao nome de Deus é associado um caráter e uma identidade que não são compatíveis com a revelação que o próprio Deus faz de si mesmo

Fonte: Guiame, Ed René KivitzAtualizado: terça-feira, 16 de junho de 2015 às 13:48
Adoração_imagem ilustrativa
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Uma divindade se apresenta a Moisés dizendo: “Eu sou o Deus de seu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque, o Deus de Jacó". Isso significa que é possível identificar que a divindade que se revelou a Abraão foi a mesma que se revelou a Isaque e também a Jacó, pois a natureza de tal revelação obedece a uma coerência unívoca. A partir dessas revelações, os Patriarcas de Israel vão conhecendo o seu Deus e aos poucos vão percebendo que Ele é absolutamente distinto dos deuses das nações vizinhas. Não demora para que os outros deuses sejam considerados ídolos e que o Deus de Israel se afirme como único Deus. O Shemá, trecho da Torah que fundamenta o monoteísmo judaico começa com as palavras: “Ouve Israel, Adonai nosso Deus é Um”.

O segundo mandamento do Decálogo proíbe a fabricação de ídolos e imagens de qualquer coisa no céu, na terra ou debaixo da terra A proibição inclui o próprio Deus. A inteligência do mandamento sugere que Deus é incomparável, e não pode ser definido ou limitado à semelhança de suas criaturas. Mais do que isso, Deus não pode ser decodificado a ponto de se tornar passível de controle e manipulação de seus adoradores – o que compreendemos, controlamos. Na verdade, os ídolos, feitos por mãos humanas é que servem aos interesses e se submetem aos caprichos daqueles que os fabricam.

A pior idolatria é aquela que resulta da equivocada compreensão do caráter de Deus, isto é, quando ao nome de Deus é associado a um caráter e uma identidade que não são compatíveis com a revelação que o próprio Deus faz de si mesmo. Jesus corrige seus discípulos Tiago e João que desejavam a destruição de um povoado samaritano afirmando “Vocês não sabem de que espécie de espírito são”. Também os discípulos no caminho de Emaús foram corrigidos por Jesus, pois foram igualmente incapazes de ligar o nome à pessoa: o Messias real era diferente do Messias imaginado. Eis a versão mais sofisticada de idolatria: atribuir a identidade errada ao nome certo. Não são poucos os cristãos contemporâneos passíveis do mesmo pecado: transformar Deus em ídolo, confundir o Deus de Abraão, o Deus de Isaque, o Deus de Jacó, o Deus de Jesus, com os deuses pagãos.

Deus é transformado em ídolo quando ocupa o imaginário das pessoas como o mais poderoso dentre todos os deuses. O monoteísmo afirma que existe apenas um Deus, e não que Deus é o deus mais poderoso. O primeiro mandamento, "não terás outros deuses", não é uma proibição à adoração de outros deuses, mas uma afirmação de que não existem outros deuses. Na verdade, os outros deuses são fabricação da mente humana, isto é, ídolos. Toda vez que Deus é comparado com "outros deuses", mesmo para que seja destacado como o maior e melhor, fica reduzido à categoria de ídolo. Deus é único.

Deus é transformado em ídolo quando é confinado aos limites de imagens, locais, pessoas, ritos, símbolos, seres ou qualquer outra coisa que dê a Ele uma medida, pois Deus é o Ser-Em-Si, não sujeito a tempo, espaço e modo. Deus é Espírito.

Deus é transformado em ídolo quando se pretende que o relacionamento com ele seja destituído de quaisquer implicações morais. Um Deus sem caráter é um ser despersonalizado, “despessoalizado”. Deus é Espírito Pessoal.

Deus é transformado em ídolo quando o relacionamento com Ele é fundamentado em relações de mérito e demérito, pois nesse caso o fator determinante do relacionamento é o humano, que faz por merecer ou deixa de merecer, isto é, Deus apenas reage. Deus é gratuidade.

Deus é transformado em ídolo quando o relacionamento com Ele é fundamentado em relações de causa e efeito, pois isso implica confinar Deus às regras de um mecanismo que pode ser ativado ou desativado, e nesse caso se pretende manipular Deus por meio da descoberta dos botões que o fazem funcionar. Deus é incondicionado.

Deus é transformado em ídolo quando as expectativas que se tem a respeito dele giram ao redor de questões meramente circunstanciais, pois o reino de Deus não é [apenas] comida, nem bebida, isto é, não está circunscrito às questões efêmeras e materiais. Um Deus em quem se espera apenas para esta vida é incapaz de vencer a morte. Deus é eterno.

Deus é transformado em ídolo quando é submetido a obrigatoriedades determinadas pela conveniência humana, pois Deus deixa de ser um fim em si mesmo e é transformado em meio para um fim maior. Deus é soberano.

Deus é transformado em ídolo quando, em seu nome, se faz exigência de sacrifícios humanos, pois Deus não se alimenta de vidas humanas, sendo Ele mesmo o doador e mantenedor da vida. Deus é amor.

Deus é transformado em ídolo quando é submetido a qualquer regra de qualquer ordem. Deus é incontrolável.

Deus é transformado em ídolo quando se torna objeto de discussão, em detrimento da devoção apaixonada, o que pode acontecer, inclusive, em relação a este texto que fica dizendo que Deus é isso e aquilo. Deus é indiscutível.

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